22.10.20

VIVA OS NOIVOS


Fui baptizada em bebé, estudei os primeiros anos numa escola católica, e fiz a primeira comunhão no devido tempo, mas o meu percurso pela igreja termina ali. Não sou católica e, mesmo acreditando que há mais facilidade na vida quando depositamos alguma esperança numa força superior a nós, prefiro manter o gosto apenas pela beleza extraordinária que as igrejas têm em imponência e detalhe.

Independentemente de crenças, gosto do Papa Francisco, como gostei do Papa João Paulo II. Gosto deles não pelo prefixo mas pela humanização e este papa é pessoa, é gente, é humano. Quando vi o filme “The Two Popes” acho que até do Papa Bento XVI fiquei a gostar. A modernidade de pensamento advém muito do contraste com a antiguidade, e os dois juntos em debate podem trazer grandiosidade.

O Papa Francisco veio agora defender a regulação do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo. Não era necessária uma opinião da igreja para que as mesmas uniões fossem feitas, é certo. E provavelmente a uma casal do mesmo sexo, que não acredite em Deus, isto faz pouca diferença. Haverá contudo pessoas que podiam viver em contradição e que sendo católicas fazem as pazes consigo mesmas por sentirem alguma validação no seu amor.

De entre as crenças que posso ter, a crença no amor é a que prevalece. Chamem-me poético-pastoril mas valido apenas a frase “mais amor por favor” que andou espalhada em graffiti por ai. Sou a favor do casamento entre pessoas do mesmo sexo e a favor da adoção por parte desses mesmos casais. Apregoa-se nesse sentido alguma falta de funcionalidade mas tenho para mim que não existem famílias totalmente funcionais. Se o forem parcialmente já é uma benção. Assim entre o que tem um casal do sexo oposto e o que tem um casal do mesmo sexo, o bom resultado tem por base o conceito de amor. Conceito esse que varias mais que a quantidade de pessoas que aguardaram por um milagre. Seja como for, satisfaz-me esta aceitação e por isso:

Viva os noivos!

Foto via Unsplash.

14.10.20

O OLHAR FOTOGRÁFICO DO GONÇALO M CATARINO


Já há muito tempo que queria falar sobre a fotografia do Gonçalo e ter deixado de trabalhar com ele trouxe a saudade de o ter por perto. Como escrever me leva sempre onde quero ir, aqui vou eu.
Conheci o Gonçalo como fotógrafo da Vintage Bazaar e, se foi um prazer ter trabalhado com ele, ter reconhecido a pessoa extraordinária que é foi aquele acréscimo ao profissional que se quer em equipa.
O Gonçalo fotografa muita coisa, provavelmente na mesma dimensão do tanto que é. Do retrato ao lifestyle, do produto ao lugar, gosto do tudo que revela, mas há uma série chamada “Musings” que, sendo apenas mais um dos seus vários projectos pessoais, me fascina.


Na variedade do que é, o Gonçalo é o que chamo de um fotógrafo completo e digo-vos, depois de anos a estudar fotografia, e de uma tese sobre um dos maiores fotógrafos portugueses (José Manuel Rodrigues), que ser completo em fotografia é coisa de mestre.
E o que é isso de ser completo? É o compromisso certo entre a técnica e o olhar fotográfico. E é nisto que ele é tão bom!


Talvez por ter uma formação inicial numa área que nada tem de artístico, o leve a ser tão analítico no que diz respeito às regras da fotografia. Sim, ao contrário do que se possa pensar, a fotografia impõe regras e fala uma linguagem própria: abertura, exposição, velocidade, enquadramento, foco, equilíbrio de brancos, etc. Combinar tudo para um resultado perfeito, aqui a nível técnico, requer tempo, preparação, e acima de tudo muita dedicação e experiência.
Poderia ser só isto e já seria excelente, no entanto quando se procura imprimir sentimento é necessário ser maior e é aqui que entra o olhar.


O olhar fotográfico é a parte da alma que se põe no que se vê, que nos traz mais do que óbvio, do que está diante dos olhos do comum observador. É preciso, como me disse o fotógrafo José Manuel Rodrigues, fotografar o que está por detrás dos olhos. E isto é aquilo que não se ensina que, ou se tem e é natural, ou sai tão forçado que nos leva quase ao vazio emocional.
A fotografia, como um quadro, só cumpre se acrescentar emoção, seja ela até negativa. É preciso sentir, estar nela, fazer-lhe quase parte e isto é tão difícil de conseguir que, dentro dos vários fotógrafos que conheço, são poucos os que são capazes de tanto.


Uma das muitas vantagens de ter conhecido o Gonçalo foram as longas conversas que fomos tendo, há sempre muito a aprender com alguém cujos limites se expandem pelo interesse e estudo em várias áreas e projectos. Pela primeira vez posso dar voz além da minha e aqui fica um pouco do Gonçalo na primeira pessoa:


1. Tendo começado a tua carreira profissional na área dos Recursos Humanos e Consultoria, como nasceu esta vontade de fotografar?

Sempre tive o “bichinho” de criar coisas e depois de muito inocentemente ter andado a brincar com uma das primeiras máquinas digitais que apareceu no mercado, resolvi continuar e ir explorando mais, porque na altura, pareceu-me que a Fotografia era a Ferramenta que me ajudava a expressar melhor as minhas ideias e influencias. Entretanto passaram-se anos de brincadeiras e experiências, até que chegou uma altura da minha vida em que precisei de fazer uma mudança grande. E quando me perguntei a mim próprio quais as coisas que mais realização me traziam, a Fotografia estava no topo e a escolha tornou-se óbvia.


2. Qual a maior dificuldade que encontraste nesta mudança profissional?

Se tivesse que eleger apenas uma, “A” maior dificuldade, diria que é saber tornar a fotografia numa actividade rentável. Porque sendo a fotografia a minha principal fonte de rendimento, acho que tem de ser encarada como um negócio e ser tratado como tal, para que se torne sustentável.
A parte técnica da fotografia e da maioria das "artes criativas”, hoje em dia, aprende-se facilmente se tivermos essa determinação. Mas o tornar esse gosto na tua fonte de rendimento, é algo que não se ensina nas universidades nem em tutoriais de youtube. E isso deve-se ao facto de não haver uma fórmula que funcione com todos. O que resulta para determinada área de mercado, não resulta para outra. O que resulta para uma pessoa altamente extrovertida, não resulta com uma pessoa que seja introvertida. E por aí fora…


3. De tudo o que a fotografia te dá, o que mais gostas no acto de fotografar?

A resposta curta e grossa seria que gosto de ver a reacção das pessoas quando lhes entrego o resultado final. Há reacções que te dão um boost incrível.
Mas deixando o ego de lado e na sequência da pergunta anterior, diria que é pagar as contas para poder continuar a fotografar mas porque também não podemos resumir tudo a números, diria que a minha resposta final, é o eterno processo de aprendizagem. Acho que cresci muito enquanto pessoa graças à fotografia. O acto de fotografar obriga-te a estar em constante aprendizagem, seja da parte técnica, seja a parte psicológica, seja marketing, etc e em última análise, diria que tudo isto obriga-te a desenvolveres-te e a crescer enquanto ser humano.
Se calhar esta resposta parece um bocado egoísta, mas o Oscar Wilde dizia que as pinturas que eram feitas com sentimento, tinham mais do pintor, do que da pessoa retratada. E eu acho que isso também se aplica à fotografia. Se queres um resultado final que te satisfaça, tens de pôr tudo o que tens em ti, no acto de fotografar.


4. Gosto particularmente, como sabes, da série “Musings” e intriga-me o nome. Porquê “Musings”?

Acho que a palavra “Musa” é algo que faz sentido a qualquer fotógrafo, mas ao mesmo tempo, pareceu-me demasiado óbvio. Depois ocorreu-me “Musings” que é uma palavra inglesa que penso que não tem tradução directa para português, mas que se refere ao acto de contemplar ou de reflectir sobre algo, que é na verdade aquilo que faço - são as minhas contemplações sobre alguém, que eu entrego sobre a forma de imagens.


5. Dentro dos teus vários projectos, tens também um podcast, o que te levou a trazer voz e como escolhes a quem dar palco?

Ouço podcasts há 7 ou 8 anos. É fácil de me lembrar, porque comecei a ouvir ainda antes de me dedicar a tempo inteiro à fotografia. Na altura, tinha de os descarregar e meter num leitor de mp3, para depois me fazerem companhia nas horas que perdia no carro a caminho do trabalho. É um formato que adoro e que continua a fazer parte do meu dia a dia. Poder escolher os programas ou os temas sobre os quais quero ouvir falar, bate qualquer rádio ou tv, onde nos servem o que não pedimos.
A determinada altura comecei a questionar-me se seria capaz de fazer algo parecido. Depois apercebi-me que conhecia umas quantas pessoas, maioritariamente “anónimas”, mas que desenvolviam actividades interessantes ou que tinham experiencia e conhecimentos em áreas e temas que me interessavam particularmente. E achei que o podcast era o formato ideal para apresentar essas pessoas a outras, que tivessem igualmente interesse sobre esses mesmos temas ou áreas.

*Todas as imagens gentilmente cedidas pelo Gonçalo.
*Pode segui-lo no instagram aqui e aqui.

23.9.19

DENTRO


Disseram-me hoje que raramente me lamento ou queixo. Também já me disseram que ultrapasso as intempéries com muita rapidez.
Acredito que haja quem duvide da dimensão dos meus sentimentos por demonstrar menos quando sofro.
É verdade que o meu muro das lamentações está pouco escrito. Rabisco por lá alguma coisa quando a dor é profunda e a preciso arrancar à bruta. Também é certo que há em mim uma dificuldade grande em chorar as mágoas em colos que não sinto meus. É mais fácil verem-me deixar cair as lágrimas a meio de um filme qualquer do que a chorar a dureza da vida.
Tenho para mim que a importância das coisas somos nós que a damos e que o queixume dá força ao que queremos deixar para trás. Concentrarmo-nos na lamúria é dar-lhe destaque e o foco que tenho está em ser feliz.
Sinto tudo, não se iludam. Se prestarem atenção veem a minha tristeza diluída nos kilos que fui perdendo. Sempre fui corpo e ele fala tudo o que não verbalizo. Cada um canaliza as emoções da maneira que sabe, mesmo que saiba pouco do que tem dentro.
A forma de expressão não é só boca.
Acho que já vos disse que sou naturalmente feliz e isso advém do espaço que dou à tristeza. Dou-lhe os mínimos para que não se instale mas ainda assim consiga ser lição. Aprende-se tanto com o que corre mal.
Deixem-me repetir. Sinto tudo e sou cheia na emoção. Alimento-me do que não se faz amargo porque a dieta certa é aquela que reduz em calorias os maus momentos, para repor em quantidade todos os bons que soubermos cozinhar.
Bom apetite!